segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Emprego

Geração à rasca
1. ARTUR, 62 anos, engenheiro em profissão liberal, comentava orgulhoso o facto do filho ter terminado um MBA na mais conceituada escola inglesa de negócios, entre os cinco melhores alunos de cinco nacionalidades diferentes. Orgulho legítimo. Mas esclarece: “A única coisa que me surpreendeu foi quando o meu filho me disse que, dos cinco, ele era o único que já estava à procura de emprego!” Estranho? Júlio cita o filho: “Os meus colegas não querem emprego coisa nenhuma, querem ser donos das suas vidas e do seu negócio, querem investir, arriscar, criar riqueza. Grandes malucos!”.
2. Miguel, 28 anos. Formado em economia, trabalhava na contabilidade de uma marca de vestuário de homem com contrato a 6 meses. Conseguiu sobreviver à primeira renovação. No início deste ano entrou para uma grande empresa de influência estatal. E directamente para o quadro! O pai é amigo de um dos administradores. Quando o pai confirmou a entrada de “sucesso” do filho no quadro da empresa, por conta da “cunha”, e para além dos respectivos agradecimentos eternos, foi rápido no comentário: “já estou descansado, já o encaixei!”.
3. Joana, 21 anos, 12º ano e nenhuma especialidade. Deixou de estudar. Mora na periferia de Lisboa e lamenta não conseguir o primeiro emprego. No shopping das Amoreiras repara numa montra: “Precisa-se empregado”. Entrou. Cuidadosa, pergunta pela função. O rosto rasga-se irritado e ofendido: “Oito horas seguidas por turno? Só descanso um dia por semana? O turno da noite só acaba às 24h? Que horror! Quanto? 500 euros? A senhora deve estar a gozar comigo! Olhe, meta cá o seu filho!”.
4. Luís, 44 anos, casado, dois filhos, funcionário público, seguia pela televisão a novela da indemnização que o oligarca russo Abramovitch pagou a José Mourinho. Não lhe interessava minimamente o facto de Mourinho querer regressar ao activo, vencer, desafiar, sentir stress! A indemnização deixava Luís em órbita e a sonhar como na histeria dos jackpot do Euromilhões: “Se fosse comigo!” comentava em suspiro e desabafava com os seus botões: “Nunca mais trabalhava na vida! Comprava uma casa na praia e ia jogar golfe! Reformava-me já e garantia o futuro dos meus filhos para que nunca mais tivessem problemas!
5. Pedro, 35 anos, licenciado em direito, casado desde os 28. Trabalha há cinco anos numa empresa autárquica na zona centro, depois de sete anos como assessor de um secretário de Estado em Lisboa. Gosta de política e desde os 18 anos que é activista na juventude do seu partido. A mãe, meio apreensiva, mostrava humildade com as amigas: “O meu Pedro nunca mais arranja nada de seguro para trabalhar e anda naquela vida há mais de dez anos, estou preocupada!”. E rematou: “Estas coisas são todas por cunhas e amizades lá no partido e ele está sem futuro. Além do mais, que vai ser do meu filho quando aquilo acabar… ele não sabe fazer nada!

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de Horácio Piriquito
in Jornal Oje

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