ELA TAMBÉM É CULPADA DE MUITAS COISAS QUE ESTÃO MAL NO ENSINO, AQUANDO DA
SUA ESTADIA NO ME COMO SECRETÁRIA DE ESTADO, MAS ESTES BATEM-NA AOS PONTOS.
NESTE ARTIGO DE OPINIÃO ELA DÁ UMAS "DICAS" DO QUE VAI MAL NESTE GOVERNO,
EMBORA AINDA DEIXE MUITO POR DIZER.
> Assunto: Desabafo de Ana Benavente
>
>
> I.Será este o País que queremos?
> >1. Não sou certamente a única socialista descontente com os tempos que
> >vivemos e com o actual governo.
> >Não pertenço a qualquer estrutura nacional e, na secção em que estou
> >inscrita, não reconheço competência à sua presidência para aí debater,
> >discutir, reflectir, apresentar propostas. Seria um mero ritual.
> >Em política não há divórcios. Há afastamentos. Não me revejo neste
> partido calado e reverente que não tem, segundo os jornais, uma única pergunta a
> >fazer ao secretário-geral na última comissão política. Uma parte dos seus
> >actuais dirigentes são tão socialistas como qualquer neoliberal;
> >outra parte, outrora ocupada com o debate político e com a acção, ficou esmagada por
> >mais de um milhão de votos nas últimas presidenciais e, sem saber que fazer
> >com tal abundância, continuou na sua individualidade privilegiada. Outra
> >parte, enfim, recebendo mais ou menos migalhas do poder, sente que ganhou
> >uma maioria absoluta e considera, portanto, que só tem que ouvir os
> >cidadãos (perdão, os eleitores ou os consumidores, como queiram) no final do
> >mandato.
> >Umas raríssimas vozes (raras, mesmo) vão ocasionando críticas ocasionais.
> >
> >2. Para resolver o défice das contas públicas teria sido necessário adoptar
> >as políticas económicas e sociais e a atitude governativa fechada e
> >arrogante que temos vivido?
> >Teria sido necessário pôr os professores de joelhos num pelourinho? Impor
> >um estatuto baseado apenas nos últimos sete de carreira? Foi o que aconteceu
> >com os "titulares" e "não titulares", uma nova casta que ainda não tinha
> >sido inventada até hoje. E premiar "o melhor" professor ou professora? Não
> >é verdade que "ninguém é professor sózinho" e que são necessárias equipas de
> >docentes coesas e competentes, com metas claras, com estratégias bem
> >definidas para alcançar o sucesso (a saber, a aprendizagem efectiva dos
> >alunos)?
> >Teria sido necessário aumentar as diferenças entre ricos e pobres? Criar
> >mais desemprego? Enviar a GNR contra grevistas no seu direito
> >constitucional? Penalizar as pequenas reformas com impostos? Criar tanto
> >desacerto na justiça? Confirmar aqueles velhos mitos de que "quem paga é
> >sempre o mais pequeno"? Continuar a ser preciso "apanhar" uma consulta e,
> >não, "marcar" uma consulta? Ouvir o senhor ministro das Finanças (os
> >exemplos são tantos que é difícil escolher um, de um homem reservado,
> >aliás) afirmar que "nós não entramos nesses jogos", sendo os tais "jogos" as
> >negociações salariais e de condições de trabalho entre Governo e
> >sindicatos.
> >Um "jogo"? Pensava eu que era um mecanismo de regulação que fazia parte dos
> >regimes democráticos.
> >
> >3. Na sua presidência europeia (são seis meses, não se esqueça), o senhor
> >primeiro-ministro mostra-se eufórico e diz que somos um país feliz.
> >Será? Será que vivemos a Europa como um assunto para especialistas europeus
> >ou como uma questão que nos diz respeito a todos? Que sabemos nós desta
> >presidência? Que se fazem muitas reuniões, conferências e declarações,
> >cujos vagos conteúdos escapam ao comum dos mortais. O que é afinal o Tratado de
> >Lisboa? Como se estrutura o poder na Europa? Quais os centros de decisão?
> >Que novas cidadanias? Porque nos continuamos a afastar dos recém-chegados e
> >dos antigos membros da Europa? Porque ocupamos sempre (nas estatísticas de
> >salários, de poder de compra, na qualidade das prestações dos serviços
> >públicos, no pessimismo quanto ao futuro, etc., etc.) os piores lugares?
> >Porque temos tantos milhares de portugueses a viver no limiar da pobreza?
> >Que bom seria se o senhor primeiro-ministro pudesse explicar, com palavras
> >simples, a importância do Tratado de Lisboa para o bem-estar individual e
> >colectivo dos cidadãos portugueses, económica, social e civicamente.
> >
> >4. Quando os debates da Assembleia da República são traduzidos em termos
> >futebolísticos, fico muito preocupada. A propósito do Orçamento do Estado
> >para 2008, ouviu-se: "Quem ganha? Quem perde? que espectáculo!".
> >"No primeiro debate perdi", dizia o actual líder do grupo parlamentar do
> >PSD, "mas no segundo ganhei" (mais ou menos assim). "Devolvam os bilhetes...",
> >acrescentava outro líder, este de esquerda.
> >E o país, onde fica? Que informação asseguram os deputados aos seus
> >eleitores? De todos os partidos, aliás. Obrigada à TV Parlamento; só é pena
> >ser tão maçadora.
> >Órgão cujo presidente é eleito na Assembleia, o Conselho Nacional de
> >Educação festeja 20 anos de existência. Criado como um órgão de
> >participação crítica quanto às políticas educativas, os seus pareceres têm-se tornado
> >cada vez mais raros. Para mim, que trabalho em educação, parece-me cada vez
> >mais o palácio da bela adormecida (a bela é a participação democrática,
> >claro). E que dizer do orçamento para a cultura, que se torna ainda menos
> >relevante? É assim que se investe "nas pessoas" ou o PS já não considera
> >que "as pessoas estão primeiro"?
> >
> >5. Sinto-me num país tristonho e cabisbaixo, com o PS a substituir as
> >políticas eventuais do PSD (que não sabe, por isso, para que lado se
> >virar).
> >Quanto mais circo, menos pão. Diante dos espectáculos oficiais bem
> >orquestrados que a TV mostra, dos anúncios de um bem-estar sem fim que um
> >dia virá (quanto sebastianismo!), apetece-me muitas vezes dizer: "Aqui há
> >palhaços". E os palhaços somos nós. As únicas críticas sistemáticas às
> >agressões quotidianas à liberdade de expressão são as do Gato Fedorento.
> >Já agora, ficava tão bem a um governo do PS acabar com os abusos da EDP,
> >empresa pública, que manda o "homem do alicate" cortar a luz se o cidadão
> >se atrasa uns dias no seu pagamento, consumidor regular e cumpridor... Quando
> há avarias, nós cortamos-lhes o quê? Somos cidadãos castigados!
> >O país cansa!
> >Os partidos são necessários à democracia mas temos que ser mais exigentes.
> >Movimentos cívicos...procuram-se (já há alguns, são precisos mais). As
> >anedotas e brincadeiras com o "olhe que agora é perigoso criticar o
> >primeiro-ministro" não me fazem rir. Pela liberdade muitos deram a vida.
> >Pela liberdade muitos demos o nosso trabalho, a nossa vontade, o nosso
> >entusiasmo. Com certeza somos muitos os que não gostamos de brincar com
> >coisas tão sérias, sobretudo com um governo do Partido Socialista!
> >
> >Ana Benavente
> >Professora Universitária, militante do PS
> >PÚBLICO, 02.12.2007
>
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terça-feira, 29 de janeiro de 2008
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